Foi pelo programa do David Rangel, na Rádio Globo, que Francisco Araújo e Andrea Roseno tiveram o primeiro contato com o #RoléCarioca e as contextualizações históricas dadas pelo professor Rodrigo Rainha. “No início não gostava muito não, rs. Mas aí parei para prestar a atenção e veio um Rolé Carioca pelo Catumbi. Teve toda aquela explicação sobre o Cemitério (São Francisco de Paula) e a entrada principal que era do outro lado da rua Itapiru... aí não tem como não gostar! Que projeto maravilhoso!”, explica a paulista Andrea, que já foi moradora do Catumbi e percebeu como o Rolé apresentou uma nova perspectiva sobre o bairro.

Em Santa Teresa, os dois foram ao Rolé juntos pela segunda vez – a primeira foi na Praça Tiradentes. “Aqui em Santa Teresa, não sabia nem que existia tanta igreja, muito menos como chegar nelas”, declara Francisco Araújo, potiguar de nascimento e mais conhecido como dono do “Sebo do Natal”, um ponto de venda e locação de livros na saída do Metrô Botafogo (entre as ruas Voluntários da Pátria e Mena Barreto).

O interesse do casal pela história e arquitetura do Rio se explica pela atividade que exercem: trabalham juntos no sebo, que funciona também como biblioteca e centro de convivência. “A nossa localização fica entre várias universidades e todo mundo acaba parando por ali, para consultar ou pegar um livro emprestado. Recebemos pedidos de muitos alunos e também colegas do professor Rodrigo Rainha da UERJ que frequentam o nosso sebo”, conta Andrea, que agora tenta junto à Prefeitura uma autorização para realizar um sebo itinerante em um trailer.

“Sempre gostei de livros e trabalhei em livrarias. Comecei a guardar livros em casa e cheguei a acumular mais de 2 mil livros. Aí deu um momento que, ou ela ia me expulsar, ou os livros, rs. Aí tive que dar um jeito. Consegui alugar esse lugar, onde comecei há 10 anos e estou até hoje”, diz Francisco, ou o famoso Natal do Sebo de Botafogo.
 

Fazer com que moradores do Rio conheçam mais a vizinhança onde vivem é um dos objetivos que o #RoléCarioca se propõe – e sempre alcança! Um grupo de amigos vizinhos a Del Castilho acompanhou o trajeto por essa área do subúrbio para descobrir outras histórias da região onde vivem, que muitas vezes se confunde com Cachambi, Todos os Santos e mesmo o Méier.

“Essa dúvida sobre o bairro, onde começa e onde termina, faz parte da nossa rotina”, confirmou a assistente de compras Michele, 29 anos, que mora próximo à fazenda do Capão do Bispo e costuma simplificar a questão dizendo que mora “perto do Norte Shopping ou a 10 minutos do Shopping Nova América". Michele foi acompanhada pelo auxiliar de escritório Bruno, 26 anos, o ‘simpatizante de história’ Gabriel Ferreira (29 anos) e a professora de história Amanda Carreira, 30 anos. Veja no papo a seguir:

Como conheceram o #RoléCarioca?
(Michele): Seguimos a página no Facebook. Este foi meu segundo #Rolé (o primeiro tinha sido pelo Catumbi, realizado em 2015) e é o primeiro de Bruno. Viemos com um casal de amigos que acompanha o #Rolé há mais tempo.
(Gabriel): Esse deve ser o nosso quinto #Rolé. Descobrimos depois do evento do Rio Comprido, quando vi anunciado no Globo. Tem tempo, acho que deve ter uns 3 anos. Depois desse, fomos acompanhando a programação.

As informações do Rolé têm utilidade para vocês?
(Amanda): Sim, já teve dados que utilizei em sala de aula, dos próprios professores que dão essa aula a céu aberto.

Como moradores das redondezas, sentiram falta de alguma coisa?
(Gabriel): Foi bem completo! Faltou falar, como anunciado no Facebook, das figuras históricas do Martin Luther King e, mais importante ainda, do Dom Helder Câmara.
(Amanda): Também onde fica exatamente o local da casa da Olga Benário e Luis Carlos Prestes. Sei que fica um pouco mais longe do trajeto, perto de Todos os Santos, mas poderia dar a localização mais exata, caso a gente queira ir sozinho, pra gente que mora aqui perto.

Nota do autor: Periódicos e diversos livros sobre Olga e Prestes mencionam a R. Honório, 279, porém a casa e a numeração originais foram modificadas com o tempo – ver a imagem destacada do livro “Brazilian Communism, 1935-1945: Repression during World Upheaval”, de John W. F. Dulles. Provavelmente, a residência fazia esquina com a R. Dr. Ferrari.
 

Receber públicos disseminadores de informação é uma das metas do projeto #RoléCarioca. E o bairro do Catumbi, meio escondidinho entre Santa Teresa, Estácio e Rio Comprido, não passou despercebido por olhos mais atentos e interessados em propagar conhecimento, como os de Ilzelni Ramos, 64 anos.

Ilzelni é guia de turismo e faz licenciatura na área pelo CECIERJ-Unirio. Em seu 5º passeio com o Rolé, conheceu mais sobre um conjunto arquitetônico extremamente rico e diverso, que conta a história do Rio de Janeiro em marcos como o primeiro cemitério a céu aberto da cidade e a Casa de Correção, mas que é praticamente excluído do circuito turístico mais popular, com exceção da Marquês de Sapucaí/Sambódromo. 

- Como conheceu o RoléCarioca?
Pelo Facebook. O que mais gosto nos passeios é a dinâmica de aprender, a didática que os professores usam.

- O que foi uma novidade para você neste passeio histórico?
Conhecer o Catumbi que, até então, era um círculo fechado para mim.

- O que você gostaria de saber mais sobre o Catumbi?
A história do colégio (Escola Estados Unidos, um edifício tombado por seu interesse histórico e cultural).

"Começamos nossa atividade no município do São Gonçalo. Quando o Crescer e Viver veio para o Rio de Janeiro, ocupamos uma área pública que não tinha, naquele tempo, nenhuma função social. O Crescer e Viver é um produto da invasão desse terreno público que por acaso estava nesse território. Não havia uma reflexão anterior sobre a Praça Onze, que é considerada berço da circulação das lonas de circos, dos circos itinerantes, especialmente do final do século XIX ao início do século XX. Nosso encontro com esse território foi um acaso, foi a área que descobrimos, que dava pra invadir sem ser muito perturbado.

A ocupação aconteceu em 2004. E, além de tentar entender as dinâmicas sociais desse território, junto com as famílias dos jovens que a gente pretendia atender e atende, fomos levados também a um processo de investigação, a uma leitura sócio-histórica do território. Nada científico, mas começamos a descobrir coisas que já sabíamos empiricamente, como o fato da Praça Onze ser o berço do samba e de outras manifestações da cultura popular. E daí vieram mais informações: a Praça Onze foi o berço dos primeiros grêmios recreativos; a comunidade judaica teve grande importância no surgimento de um tecido social organizado; e aqui surgiu o circo.

Ficamos muito felizes com o fato de, décadas depois, já no século seguinte, estarmos no cumprimento da função de preservar essa simbologia que existe na Praça Onze.

No primeiro momento, a instituição estava mais preocupada com a utilização do circo como uma ferramenta pedagógica, para um trabalho de integração social - o desenvolvimento de uma perspectiva integral de crianças e jovens de classes populares, que vivem não só aqui, mas nas comunidades favelizadas do entorno. Esse trabalho ganhou uma dimensão estética, criativa, e o Crescer e Viver começa a avançar neste outro campo: o de apropriar o desenvolvimento de habilidades desse jovens e crianças num processo de modelagem de modos de expressão artística e criativa do circo.

É raro o recebimento de circos desde que chegamos à Praça. Temos o problema nacional da dificuldades de circulação das estruturas de lonas itinerantes. De 2004 para cá, vemos que o Crescer e Viver cumpre o papel de preservação desse território da memória, como uma ação física e objetiva do circo, mas que tem impacto de preservação desse berço das tradições circenses da cidade do Rio de Janeiro."

Artigo de Junior Perim no livro "Vidas e Obras: Estácio, Cidade Nova e São Carlos", de Bernando Vilhena e Maurício Barros de Castro. Junior é cofundador e diretor-executivo do Crescer e Viver, um circo que une arte, educação e transformação social, e retoma a tradição circense do lugar. Fundado em 2000, o Crescer e Viver mudou-se para a região da Praça Onze em 2004, onde se encontra até hoje. Crédito da Imagem: Roberto Pontes

"Meu nome vem do bairro. A escola também é Estácio, mas muito depois de mim. Utilizei esse nome em 1974, quando gravei meu primeiro disco, e a escola era Unidos de São Carlos até 1984. Nesse ano é que a escola resolveu trocar o nome para Estácio.

O São Carlos era um morro habitado por muitos portugueses. Não sou diferente disso, sou filho de português com uma pretinha do morro. Então nasci no último barraco lá do morro do São Carlos, e a minha chegada ao samba foi porque meu pai ia trabalhar e tinha mania de birosquinha - no morro o nome era tendinha - , e eu, garoto, ainda passei a tomar conta da tendinha depois que voltada do colégio. Ali rolava só samba, não existia droga, não tinha nada, valentia não existia, era um respeito incrível que o menino tinha pelo mais velho, aquilo ali era muito saudável.

Fui vivenciando aquilo ao longo dos anos, até que um dia me levaram para um bloco ali no Catumbi, chamado Bloco da Onça, e quando vi estava cantando. Quando foi 1974, tinha um cara que escrevia no extinto jornal Última Hora, chamado Roy Sugar, que resolveu escrever a contracapa do meu disco. Ele era famoso no jornalismo e perguntou qual era meu nome. Minha mãe me chamava de Dominguinhos, mas já tinha o Dominguinhos do Acordeon. 

Ficou Dominguinhos do Estácio, porque eu pertencia à comunidade do Estácio. Foi assim que surgiu."

Depoimento de Dominguinhos ao livro "Vidas e Obras: Estácio, Cidade Nova e São Carlos", de Bernando Vilhena e Maurício Barros de Castro. Compositor, cantor e intérprete de sambas-enredos, Dominguinhos iniciou sua carreira na Unidos de São Carlos, na década de 1960. Desde então, utilizou sua voz para conquistar títulos em diversas escolas, entre elas a Estácio de Sá, agremiação do seu bairro que se tornou campeã em 1992, com Dominguinhos cantando na avenida Marquês de Sapucaí o enredo Pauliceia Desvairada.