Museu Imperial, casa histórica e espaço de memória do Segundo Reinado
Depoimento de Alessandra Fraguas,
Sou petropolitana, sempre vivi em Petrópolis, mas foi quando cursei a faculdade de história que me aproximei, de fato, do Museu Imperial. Em 2008, fui contratada para trabalhar em uma exposição e comecei a me familiarizar com o acervo. O que está em exposição permanente, dentro do palácio, corresponde a 7% do acervo. O visitante às vezes não tem ideia da riqueza que existe por trás do museu. Só no Arquivo Histórico, há cerca de 200 mil documentos. São mais 8 mil itens do Acervo Museológico e 60 mil títulos na Biblioteca.
No período em que trabalho aqui, pude participar de dois projetos que considero marcos para a instituição: o de nominação no Programa Memória do Mundo da UNESCO e o de digitalização do acervo. Em 2010, preparamos a candidatura dos Documentos Relativos às Viagens do Imperador D. Pedro II pelo Brasil e pelo Mundo na etapa regional do programa da UNESCO, que culminou com sua nominação internacional em 2013. O título equivale ao de Patrimônio da Humanidade que a UNESCO concede a bens paisagísticos e patrimoniais edificados e reconhece a importância dos acervos arquivísticos. Posteriormente, outros conjuntos documentais também foram nominados neste programa: o da Coleção Carlos Gomes, o relativo à Guerra da Tríplice Aliança e a coleção fotográfica Sanson, formada por negativos de vidro, uma técnica de fotografia estereoscópica criada ainda na segunda metade do século XIX. Tanto a Coleção Carlos Gomes quanto a Sanson já estão digitalizadas e disponibilizadas online no site do Museu Imperial, na página do projeto DAMI (Digitalização do Acervo do Museu Imperial). Depois do arquivo, fui trabalhar com técnica em acervo na Biblioteca, na área do DAMI. Hoje temos cerca de 15% do acervo digitalizado e disponível na internet. É um trabalho a longo prazo que requer, muitas vezes, recursos via patrocínio. As primeiras etapas do projeto foram concluídas em 2010 nesse sistema, com a participação de empresas via leis de incentivo fiscal.
O Arquivo Histórico do Museu Imperial tem dois eixos principais de documentação, um de documentos referentes à cidade e à história de Petrópolis e outro do Brasil Império. Mas o tema que se destaca nas solicitações de pesquisas é o período do Segundo Reinado e, mais especificamente, D. Pedro II. Porque aqui temos um importante fundo documental, o Arquivo da Casa Imperial do Brasil, formado por cerca de 40 mil documentos de caráter privado, correspondências, minutas de documentos oficiais, rascunhos, cadernos de estudos e diários que pertenceram à família imperial, doado ao Museu Imperial pelo príncipe d. Pedro Gastão de Orleans e Bragança, bisneto de d. Pedro II, em 1948.
Estou convencida de que D. Pedro II é a pessoa mais estudada da história do Brasil, a partir de um levantamento historiográfico que fiz, de biografias no sentido clássico, livros de assuntos diversos que trazem a figura do imperador, teses e dissertações. A recém-lançada biografia “D. Pedro II – a História não Contada”, do pesquisador Paulo Rezzutti, usou como fonte o acervo histórico do Museu Imperial. Também recebemos os produtores da novela “Nos Tempos do Imperador” (título provisório, prevista para estrear em 2020 na TV Globo), que vai abordar o triângulo formado por D. Pedro II, Teresa Cristina e a Condessa de Barral, no período entre 1856 e 1870. O fato de existir essa novela em produção demonstra como D. Pedro II continua suscitando interesse de um público muito mais amplo, que extrapola o meio acadêmico e as pessoas que trabalham diretamente com educação e cultura.
No momento, o visitante poderá conferir a exposição temporária “Cadeira: Forma & Função", com a curadoria das técnicas da museologia, sobre cadeiras que compõem o acervo do Museu Imperial, inclusive o próprio trono. Como essa exposição tem um visual muito diferenciado, para o visitante é uma experiência atravessar as salas bem tradicionais do museu e entrar nessa última sala de exposições. Verá uma proposta muito interessante: o trono colocado como um objeto para se sentar, despido de todo seu caráter simbólico.
A próxima exposição, prevista para dezembro, será em comemoração ao bicentenário de Dona Maria da Glória (Maria II, Rainha de Portugal). Antes, teremos o lançamento do documentário “Nos Jardins do Palácio Imperial”, da professora Beatriz Galvão, que será exibido durante todos os dias da Primavera dos Museus, agora no mês de setembro. Realizado em parceria com o museu, o filme mostra memórias relativas aos vários usos do jardim que rodeia o palácio, desde a época em que o edifício era residência, passando pela constituição do museu até os dias atuais. O parque é um verdadeiro oásis no centro de Petrópolis, frequentado por estudantes, famílias, praticantes de tai chi chuan, pintores de aquarelas, leitores. Nas dependências do museu ainda são realizados as encenações “Um Sarau Imperial” e “Chá da Princesa”, o espetáculo “Som e Luz” e o bate-papo com estudiosos e moradores da cidade “Fale-me de Petrópolis”, que acontece toda última quinta-feira do mês, de março a novembro, na Biblioteca.
Quando se pensa o Museu Imperial, não é só a exposição permanente, não é só o Palácio. É todo um parque, que incluiu o complexo dos jardins, e os bastidores técnicos: Biblioteca, Arquivo Histórico, Museologia, um laboratório de conservação e restauração, um setor de educação que desenvolve projetos pedagógicos e recebe escolas, a Biblioteca Rocambole, voltada para o público infantojuvenil e a Casa de Cláudio de Souza, seccional do Museu que fica na Praça da Liberdade. O trabalho, por trás daquele que o público vê na exposição, é imenso. Esses bastidores podem ser conhecidos no projeto institucional “O Museu que não se vê”, que recebe grupos de até 30 pessoas toda última quarta-feira do mês (entre março e novembro) e requer agendamento.
Formada em Ciências Sociais e História, a petropolitana Alessandra Fraguas atua no Museu Imperial desde 2008. Também é associada titular do Instituto Histórico de Petrópolis.