Vida longa ao Beco das Garrafas
Artigo de Bernardo Vilhena,
"O início da segunda metade do século vinte foi marcado por grandes mudanças na moda e nos costumes. No Rio de Janeiro, com a abertura do Túnel Novo, a vida noturna da cidade se mudou pra Copacabana. A boemia ganhou um novo endereço. E a juventude trocou de vez as águas abrigadas da Baía da Guanabara pelas praias oceânicas. O novo destino era a Avenida Atlântica.
Foi nas ondas de Copacabana que a Bossa Nova ganhou forma, criou corpo no seu doce balanço a caminho do mar. A poesia lançava uma aura de felicidade, dando fim a dores de cotovelo, fossas e outras tristezas, que não tinham nada a ver com a geração que estava dando seus primeiros passos na arte de amar.
Essa busca da felicidade deu início à revolução que teve início no final dos anos 1950 e reverbera até os dias de hoje. Essa explosão musical teve um epicentro: o Beco das Garrafas. O Beco surgiu como ponto de encontro de músicos vindos de todas as partes do país. Lá podia-se ouvir um som criado por instrumentistas brilhantes, com rigorosa formação musical, donos de invejável técnica e, sobretudo, com vasto conhecimento dos ritmos brasileiros. Eram gênios, músicos virtuosos dando o melhor de si para uma plateia atenta e privilegiada.
E lá se podia ouvir o alagoano Hermeto Paschoal, o acreano João Donato, o paranaense Airto Moreira, o paulista Paulo Moura, o niteroiense Sergio Mendes entre outros grandes artistas que brilharam em todo o mundo, principalmente, nos Estados Unidos. Quando grandes cantores americanos se apresentavam no Golden Room do Copacabana Palace, que fica a duas quadras do Beco, os músicos faziam questão de ir lá participar de jam sessions.
O Beco das Garrafas foi o berço de cantores do naipe de Elis Regina, Wilson Simonal, Jorge Benjor e surgiu com uma ideia simples: ouvir música da mesma maneira com que se fazia música, na intimidade.
Eram três casas com pouco mais de quarenta lugares, Bacará, Little Club e Bottle’s. O Beco das Garrafas continua em plena atividade apresentando novos instrumentistas e nomes consagrados da música brasileira."
O poeta e compositor Bernardo Vilhena foi editor das revistas de poesia "Malazartes" e "O Carioca" e, nos anos 70, fundou o Coletivo Nuvem Cigana ao lado de Ronaldo Santos, Ronaldo Bastos, Chacal, entre outros. Letrista de importantes sucessos, tem mais de 200 músicas gravadas por Cazuza, Cássia Eller, Ed Motta, Elza Soares, Alcione e Ritchie (com quem compôs o mega sucesso "Menina Veneno").